A Percepção da Vida
A forma como percebemos o mundo, afeta o mundo. Embora essa afirmação possa parecer abstrata, ela é bem verdadeira.
Esta ideia foi partilhada por mim durante em um seminário sobre sustentabilidade interior. A expositora explicou a relação da Terra conosco: “a Terra sempre será uma mãe, independente da situação”. Realmente concordo que o papel da natureza e sua intenção conosco sejam sempre generosos e de busca de equilíbrio. Já que, mesmo maltratando uma árvore, ela continuará a lhe dar frutos. A terra, mesmo depois de repetidas queimadas, estará sempre buscando a sua reestruturação. Os animais somente exercem o instinto de defesa quando ameaçados. Todo o sistema busca fluir em harmonia, caminhando para o equilíbrio naturalmente. Assim, a postura da Terra em relação a nós é de mãe, provedora, generosa, harmonizadora.
Entretanto, a nossa postura de “filhos” em relação a ela foi deturpada, tal como a atual relação de pais e filhos foi corrompida por outros valores. É comum ouvirmos os mais velhos mencionando o quanto respeitavam os seus pais, que a relação era de amor, mas em hipótese alguma cogitavam desobedecê-los. Enquanto, hoje, observamos uma disputa de poder entre filhos e pais e uma consequente desvalorização destes que dedicaram amor, afeto e, consequentemente, a vida a seus filhos.
Essa notável perda de valores em relação às gerações anteriores se manifesta, por exemplo, através das crianças que possuem uma percepção da autoridade e do seu papel/lugar na família inflados. A falta de pulso dos pais as transformaram em pequenos tiranos: barganham, são mais violentos para defender seus desejos, exigem mais recompensas para fazerem o que os pais querem que eles façam.
Essas crianças ao se tornarem jovens, continuam abusando da renda de seus pais, que trabalham cada vez mais e por mais tempo, pois se veem obrigados a sustentar as necessidades dos filhos. Perdeu-se o desejo pela independência, a vontade de morar sozinho. A meta agora é permanecer com os pais cada vez mais, porque o padrão de vida que os pais proporcionam é superior àquele que o jovem conseguiria trabalhando. Ou seja, eles querem sair de casa somente quando puderem ter o padrão que os pais proporcionam a duras penas.
E, se a percepção do valor das pessoas está tão deturpada, não é de se estranhar que a percepção em relação às coisas e à natureza também esteja. Em função disto é que proponho uma alteração de percepção. Que possamos refletir: “Como percebo o meu papel com relação à mãe Terra?; Que tipo de filho eu sou?; Qual a minha principal intenção em relação a ela?”.
A relação de parceria/companheirismo seria a relação mais próxima que deveríamos buscar. Dela brotariam algumas posturas mais compatíveis com aquilo que precisamos desenvolver: sentimento de responsabilidade conjunta, de que a minha atuação é necessária para que o relacionamento se mantenha, de que é necessário fazer concessões em nome da harmonia, de que deve haver respeito pelo tempo do outro e de que temos valores equivalentes e que não se sobrepõem.
Essa relação também possui um tom de maturidade, pois é como se finalmente o filho crescesse, percebesse o real valor de sua mãe e passasse a se relacionar com ela de forma mais madura. Nesse mesmo paralelo de relação mãe-filho, é como se a mãe atingisse uma idade avançada, com problemas de saúde e restrições de atuação, e finalmente isso despertasse no filho o sentido de responsabilidade, de generosidade, de gratidão. Talvez um pouco tarde, mas ainda assim uma vitória.
Observamos que o que acontece com a natureza é que alguns filhos já estavam conscientes e alguns foram alcançando esse estado conforme as desarmonias se agravavam, sendo que alguns ainda não conseguiram amadurecer o suficiente para perceber a situação.
Fonte: Arpoador Cosmeticos |
A alteração da percepção é a peça chave e isso não é algo pequeno, pelo contrário, é algo que está no cerne da nossa atuação e afeta todo o restante: pensamentos, palavras, atos, relacionamentos e conexões.
Sendo assim, qual seria o meio capaz de alterar nossa percepção?
Talvez o amor pelo meio em que vivemos, talvez a dor por vê-lo em um estágio de degradação, talvez uma reflexão sobre o nosso papel no mundo…
E quantos de nós estamos realmente conscientes de qual é a nossa percepção da vida ou com quais valores estamos realmente comprometidos?
Também precisamos pensar na pergunta que não quer calar: Se alguns não acordam nem pela dor alheia (dor do meio em que estão inseridos), o que fará com que eles acordem?
Todo o restante é consequência da nossa percepção da vida e do mundo que temos, então deveria ser dada importância especial a isto. Portanto, reflitamos:
Como identifico/ percebo o meio?
Qual a minha atitude em relação a ele?
Qual a intenção implícita nas minhas ações corriqueiras?
Eu poderia fazer diferente?