Sustentabilidade, Valor e o Consumidor
A preocupação ambiental tem crescido ao longo dos anos, desde a década de 1970, quando começou a surgir a preocupação sobre impactos ambientais causados pelo modelo econômico vigente de produção e consumo excessivos. A mentalidade do consumidor também se alterou ao longo desse período, clamando por um mundo mais sustentável. Nesse período de mudanças, as empresas seguem querendo se destacar e se adequar à mudança comportamental. De acordo com Kazazian (2005), elas têm um importante papel, já que podem adotar atitudes que possibilitam novos processos produtivos, resultando em novos produtos e, por último, novas relações de consumo. Assim, os que encontrarem os caminhos para se diferenciar serão beneficiados, ganharão espaço e agregarão valor aos produtos.
Conciliar o crescimento econômico com a preservação ambiental é um desafio e exige que os empreendedores tenham em mente o desenvolvimento e a competitividade dos negócios, a minimização dos impactos no meio-ambiente e, ainda, a satisfação do consumidor que deve perceber esses esforços como valor agregado. A mudança cultural e comportamental se faz necessária, visto que a percepção de bem-estar por parte dos indivíduos está pautada na posse de bens materiais (MANZINI, 2008). A redução, reciclagem e reutilização de recursos, não são, isoladamente, suficientes para a transição à sustentabilidade, pois sem a aceitação do usuário, não existe inovação sustentável. Kazazian (2005) afirma que os consumidores se mostram cada vez mais preocupados com as questões de ordem ambiental, utilizando seu poder de compra para adquirir produtos que sigam os princípios sustentáveis.
Ao tratar da responsabilidade de empresas e indústrias na transição para uma sociedade sustentável, é imprescindível citar a indústria da moda, que acarreta sérios impactos ambientais devido aos seus processos produtivos poluentes. Ainda, ressalta-se seu sistema cíclico e efêmero, de obsolescência programada, que se caracteriza pela renovação rápida e constante de produtos, e pela busca incessante por novidades, que segundo Simmel (apud Cidreira 2005) se apoia na dialética entre a necessidade de imitar e a vontade de se diferenciar do ser humano.
Solomon (2002) argumenta que o consumidor de moda, muitas vezes, adquire um produto novo mesmo que o antigo ainda sirva, pois é motivado principalmente por tendências estéticas. Segundo o autor: “algumas razões para essa substituição incluem um desejo de ter novas características, uma mudança no ambiente da pessoa […] uma mudança no papel ou na auto-imagem da pessoa.” (SOLOMON, 2002, p.249)
Miranda (2008) argumenta que nada melhor que a moda para demonstrar a necessidade de mudança da sociedade, ou seja, do novo, que se reflete no processo de consumo. O consumo contribui para a identidade do indivíduo, e no que concerne ao consumo de moda, a valorização geralmente se dá pelo atributo estético.
Em contrapartida a esse cenário de moda rápida, poluente e exploradora, Schulte et al (2014) e Lee (2009) argumentam que está se vivendo em uma era na qual a indústria da moda, junto de outras instituições, direcionam esforços para diminuir esses impactos causados no meio ambiente, seja através da reciclagem, de tecidos e corantes ecológicos, do trabalho justo ou outras alternativas. As empresas, segundo Lee (2009), têm procurado se posicionar como sustentáveis, utilizando esse atributo como proposta de valor, além de desenvolver produtos de acordo com os princípios sustentáveis, considerando a demanda de um consumidor consciente.
Para Kazazian (2005), é importante educar a sociedade para a conscientização ambiental, pois assim aumentará a demanda pelos produtos sustentáveis. Qualquer intenção de mudança é importante e válida se visa diminuir os danos causados pelo sistema de produção e consumo vigente. Entretanto, só trará resultados se tiver aceitação.
Para tanto, deve-se levar em conta o comportamento do consumidor, porque se não houver demanda e desejo pelo produto ou serviço, não há razão dos mesmos existirem. É através da sua demanda que as empresas irão criar estratégias e direcionar esforços para conduzir suas atividades de maneira sustentável. Para Kotler (2000), o valor percebido pelo cliente vai além do critério monetário, e contempla todo benefício que este obtém com a troca. Ou seja, o valor total de um produto ou serviço para o consumidor é um conjunto de benefícios que este espera, e pelo qual se dispõe a pagar. Havendo aceitação e percepção do valor de sustentabilidade, surgem oportunidades para as empresas desenvolverem estratégias competitivas, posicionando-se como marcas de moda sustentáveis, e agindo como tal.
Mas a sustentabilidade, quando aplicada como valor ao produto de moda, é percebida desta forma pelo consumidor? E quais atributos sustentáveis são percebidos por estes consumidores no vestuário? A sustentabilidade é uma oportunidade para novos negócios na área da moda, considerando o aumento de conscientização do consumidor, já discutido anteriormente.
Fonte: Revista Cliche
Paradoxalmente, o setor da moda representa um grande desafio nessa mudança de comportamento do consumidor, considerando que este ainda busca novidades a preços baixos em tempo reduzido, o que caracteriza o mercado fast-fashion(LEE, 2009). Dessa forma, é importante verificar se o consumidor está disposto a pagar mais por um produto sustentável, mesmo quando tem à sua disposição uma moda mais acessível em custos, como as lojas de departamento, justamente as grandes redes que caracterizam o fast-fashion. Faz-se necessária uma análise sobre quais atributos (modelagem, materiais, marcas, preços, etc) são percebidos e valorizados a ponto de poderem influenciar estratégias de posicionamento e novos negócios nesse modelo.
Será que o consumidor de moda percebe a sustentabilidade como valor (de acordo com o conceito de Kotler) nos artigos de vestuário, a fim de justificar o posicionamento sustentável de novos negócios no setor? Identificar quais fatores influenciam seu comportamento de compra é fundamental para incentivar a aceitação dos produtos sustentáveis.
Referências:
CIDREIRA, Renata P. Os sentidos da moda. São Paulo: Annablumel, 2005.
KAZAZIAN, Thierry (Org.). Haverá a idade das coisas leves. São Paulo: Senac São Paulo, 2005. 194 p.
KOTLER, Philip. Administração de Marketing. São Paulo: Pearson, 2000.
146 p.
LEE, Matilda. Eco chic: o guia de moda ética para a consumidora consciente. São Paulo: Larousse do Brasil, 2009. 224 p.
MANZINI, Ezio. Design para a inovação social e sustentabilidade: comunidades criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais. Rio de Janeiro: E-papers, 2008, 103 p.
MIRANDA, Ana Paula de. Consumo de moda: a relação pessoa – objeto.
SCHULTE et al. Logística reversa, reutilização e trabalho social na moda. ModaPalavra e-periódico. Revista ModaPalavra. v. XIV, n.13, Jan – Jun 2014, http://www.iri.usp.br/documentos/ref_ABNT_Chicago_Out12.pdf– acesso em 17 de outubro de 2014