Vive-se no Brasil um momento de alerta para os atores envolvidos com a preservação ambiental. Durante décadas, falava-se que a legislação brasileira era avançada na questão ambiental, mas havia um abismo entre previsão e prática.

Porém, observa-se atualmente um movimento de flexibilização da estrutura jurídica ambiental classificada pelo professor Rogério Rocco [1] como fase retrô por caminhar na contramão de um sistema erguido desde a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) e consolidada através da Constituição de 1988.
Como exemplo, cita-se, aqui, o Projeto de Lei nº 3682/2011 da Câmara Federal e a Proposta de Emenda Constitucional nº 72/2011 que buscam formas de desnaturar um dos importantes instrumentos de proteção ao meio ambiente: as Unidades de Conservação.
Espécie de espaços especialmente protegidos, as Unidades de Conservação possuem base constitucional no art. 225, III e foram delimitadas pela Lei nº 9.985/2000.
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Parque Nacional Yellowstone |
Como registro histórico, sabe-se que o conceito moderno de Unidade de Conservação remonta ao Parque Yellowstone criado em 1872 nos Estados Unidos da América. No Brasil, a Reserva Florestal do Acre de 1911 pode ser dada como uma das primeiras referências. Curioso, aliás, reler o preâmbulo da norma instituidora desse espaço protegido, na medida em que a distância do tempo não impede a semelhança com a realidade atual. Segue a transcrição:
“O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, atendendo a que a devastação desordenada das matas está produzindo em todo o país efeitos sensíveis e desastrosos, salientando-se entre eles alterações na constituição climatérica de várias zonas e no regímen das águas pluviais e das correntes que delas dependem; e reconhecendo que é da maior e mais urgente necessidade impedir que tal estado de cousa se estenda ao Território do Acre, mesmo por tratar-se de região onde como igualmente em toda a Amazônia, há necessidade de proteger e assegurar a navegação fluvial e, consequentemente, de obstar que sofra modificação o regímen hidrográfico respectivo [2].”
Mediante falso discurso de contraposição de desenvolvimento, agricultura e preservação ambiental, o Projeto de Lei nº 3682/2011 da Câmara Federal propõe alterar a legislação para permitir a prática de mineração em 10% da área de Unidades de Conservação.
Noutra via, a Proposta de Emenda Constitucional nº. 72/2011 pretende de forma silenciosa restringir ou até mesmo impedir a criação de novas Unidades de Conservação. Isso porque subtrai a possibilidade de instituição dessas áreas por normas elaboradas pelo Poder Executivo, na medida em que alteraria a Constituição para exigência de lei. De forma ardilosa, levanta-se a bandeira de maior participação da sociedade através de seus representantes no processo legislativo em contraponto aos Decretos que comumente são os modelos adotados para essa criação.

FONTE: Evaristo de Miranda
Cumpre salientar que as Unidades de Conservação atualmente podem ser criadas por “ato do Poder Público”, ou seja, a via legal já é uma possibilidade. Desse modo, a tentativa é de frear a criação de novos espaços, pois basta uma rápida pesquisa para contabilizar o número ínfimo de instituições através de lei específica.
Organizados, parlamentares formaram uma Frente Parlamentar em Defesa das populações atingidas por áreas protegidas composta por 196 Deputados Federais para o desenvolvimento de outros projetos legislativos como os apresentados. Na verdade, sugeriria que o bloco fosse chamado de Frente Parlamentar de Flexibilização de áreas protegidas. Mais honesto, talvez.
[1] ROCCO, Rogério. História da Legislação Ambiental Brasileira: um Passeio pela Legislação, pelo Direito Ambiental e por assuntos correlatos. Curso de Direito Ambiental. Coordenação: AHMED, Flávio e COUTINHO, Ronaldo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012.
[2] Decreto nº. 8.843 do dia 26 de julho de 1911
