Saiba como antigos hábitos de comunidade estimulam a nova economia compartilhada
Há poucos dias, meu amigo Leonardo Borges escreveu aqui no Autossustentável sobre o incrível aplicativo Tem Açúcar, que já é um marco da economia compartilhada no Brasil. Entendo que hábitos como pedir emprestado ao invés de comprar não são novidade. Oferecer dinheiro a um amigo que precisa também não. Consertar ao invés de comprar, menos ainda. Mas a organização dessas ações em plataformas digitais cada vez mais transparentes, completas e acessíveis apontam para uma tendência importante e potente: nós queremos dividir com mais consciência.
Quero ter a confiança de emprestar minha bicicleta a um desconhecido e ganhar de volta não só a magrela, como também um novo amigo. Ter a força para trazer minha banda preferida para tocar na minha cidade, e também a clareza sobre qual projeto ou empresa meu dinheiro investido está ajudando a fomentar. Essa é a essência da era do despertar da consciência, uma nova fase que o mundo merece e precisa de forma urgente. Nossos hábitos de consumo desenfreado foram grandes propulsores da degradação ambiental e efeitos severos das mudanças climáticas até aqui. É hora da mudança de paradigma! E a tecnologia está se mostrando uma boa aliada.
Além das plataformas de crowdfunding já consolidadas, como Kickante, Catarse e Benfeitoria, novos (e nem tão novos) conceitos dentro do guarda-chuva do “financiamento coletivo” passaram a tomar corpo no Brasil e no mundo. Um deles é o equity crowdfunding: permite que qualquer pessoa invista em projetos de terceiros em troca de uma participação no negócio. Isso quer dizer que você pode fomentar um projeto que faz sentido para você ao mesmo tempo em que multiplica seu dinheiro. Pode ser a startup de um amigo, uma loja de pães artesanais no interior da Califórnia, ou até mesmo a remodelação de um edifício em Manhattan.
A Prodigy Network, com o projeto The Assemblage em Nova York, é um dos exemplos desse novo ciclo de democratização dos investimentos no mundo imobiliário ao possibilitar a entrada de qualquer pessoa em projetos que antes eram acessíveis apenas a uma elite muito privilegiada. A plataforma online permite que qualquer um, em qualquer parte do mundo, invista em edifícios de Manhattan que são verdadeiros hubs para agentes e projetos de impacto positivo. São espaços de coworking e coliving (vou falar deles mais pra frente!) dedicados a fomentar conexões, projetos e workshops voltados ao auto-conhecimento, bem-estar, biologia e desenvolvimento humano. O investimento mínimo atual é de 10 mil dólares, e a expectativa é que seja de apenas 100 dólares num futuro próximo. Os rendimentos esperados ficam em torno de 12% ao ano. Afinal, não é doação, é investimento… com mais consciência.
Outro exemplo, dessa vez nacional, é o urbe.me, de Porto Alegre, que também promove o equity crowdfunding em negócios imobiliários. Na plataforma brasileira os investimentos partem de R$ 1 mil e possuem parceria com construtoras locais. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão regulador do mercado de capitais, regulou a modalidade esse ano, trazendo ainda mais transparência e segurança para esse tipo de operação no país. Com esses exemplos, percebemos que uma nova lógica de relação entre investidor-investimento é estabelecida, bem diferente de apenas deixar o dinheiro aplicado em fundos do seu banco, que usa a grana como lhe convém. O novo formato dá mais sentido, facilidade e transparência no processo todo.
Estas mesmas características são valorizadas pelas pessoas que escolhem compartilhar não apenas investimentos ou projetos, mas também seus espaços de trabalho (coworking) e até mesmo de moradia (coliving). O mercado de coworking no país cresceu 114% do ano passado para cá, mesmo com a crise, de acordo com dados do Censo Coworking Brasil. Já a prática de coliving ganha terreno de forma mais lenta, mas consistente com empresas como o WeWork apostando alto no setor. A gigante americana, avaliada em US$ 2 bilhões, já conta com dois prédios de moradia compartilhada, em Washington DC e Nova York, com planos de expansão rápida.
Já a Roam possui casas compartilhadas em Bali, Miami, Tóquio, Londres e São Francisco. Em cada localidade existe um anfitrião que cuida dos detalhes, a limpeza é feita diariamente, a cozinha abastecida e sempre tem amigos para conversar sobre seu dia. A ideia é oferecer um clima acolhedor ao ficar em qualquer uma dessas cidades por um período mais longo, já que o anfitrião faz isso porque ama e cada morador ama compartilhar… principalmente se for de uma forma cada vez mais consciente. São os antigos hábitos de comunidade potencializando a nova economia.