Balanço sobre Fórum Mundial da Água
Nesta última semana aconteceu o Fórum Mundial da Água em Brasília. Durante o encontro, representantes de mais de 100 países estiveram presentes em nossa capital para discutir de forma holística a gestão dos recursos hídricos em nível local e global.
Neste ano, os brasileiros sugeriram como temática prioritária o compartilhamento da água e todas as questões políticas, sociais, econômicas e humanitárias daí decorrentes.
Uma das marcas principais do Fórum, neste ano contou-se com a presença de parlamentares de mais de 20 países, representantes do setor empresarial, ONGs, membros da sociedade civil e entusiastas, que contribuíram com a construção das mensagens das mais diversas formas, desde encontros de alto nível para discussões de políticas públicas a campanhas de conscientização e engajamento pelo uso da água.
Os diversos organismos do Fórum tiveram diferentes resultados, cartas e publicações sendo lançadas, mas, possivelmente, a de maior impacto é a Carta de Brasília – uma declaração (informal) que foi desenvolvida desde o ano passado por representantes políticos de alto nível dos países envolvidos.
A declaração sugere que a aplicação de um “direito da água” ou similar deva ser seguido por 10 princípios:
- A água como bem de interesse público.
- Justiça da água, uso da terra e a função ecológica da propriedade.
- Justiça da água e populações indígenas, tribais, montanhosas e outras em bacias hidrográficas.
- Justiça da água e prevenção.
- Justiça da água e o princípio da precaução.
- In dubio pro aqua (no caso de incerteza, os recursos hídricos e os ecossistemas têm de sempre serem protegidos).
- Poluidor-pagador, usuário-pagador e internalização das externalidades ambientais.
- Justiça da água e boa governança hídrica.
- Justiça da água e integração ambiental.
- Justiça da água procedural.
Resumidamente, os pontos defendem que legislações e uma justiça que aborda questões sobre a gestão dos recursos hídricos devam priorizar a preservação da água e dos ecossistemas, devam ser inclusivas a todos os usuários e devam levar em conta conceitos já bem estabelecidos nas discussões ambientais, como o princípio da precaução, o poluidor-pagador e da internalização das externalidades ambientais.
Por outro lado, é claro que o encontro nunca foi antes e nem esteve nessa edição isento de críticas. Diversas ONGs acusam o Fórum de ser uma plataforma financiada por grandes empresas para que as mesmas possam “cooptar” a agenda de discussões sobre recursos hídricos a fim de que seu lobby em questões estratégicas para as mesmas – por exemplo, em temas controversos como precificação da água – possa ter êxito.
Não à toa, nesta edição, concomitantemente ao evento, tivemos mais uma vez a realização do Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), cuja declaração final defende que “a água não é mercadoria, a água é do povo”, denunciando uma série de empresas multinacionais e que “água é vida, é saúde, é alimento, é território, é direito humano, é um bem comum sagrado”.
Do meu ponto de vista, ainda que entenda e compactue com muitos dos pontos levantados pelo FAMA, o Fórum Mundial da Água mantém, sim, sua relevância por levar a agenda de discussão política global um assunto que quase sempre é somente discutido em âmbito regional/nacional.
A troca de experiências, de exemplos de legislação, de boas práticas; o compartilhamento de preocupações que transcendem barreiras nacionais; o posicionamento em tópicos antes simplesmente ignorados pela agenda política global; e, é claro, o a relevância de manter não só a agenda ambientalista, mas o protagonismo dos recursos hídricos nessa agenda, ante sua importância vital para a humanidade – todos esses são pontos que merecem, sim, ser elogiados, reforçados e perpetuados na organização de Fóruns – alternativos ou não – como esses.
O próximo Fórum Mundial da Água acontecerá em 2021, no Senegal.