Cada um de nós vem acompanhando em tempo real os movimentos de uma crise sanitária global. Percebemos muitas inovações despontando e ao mesmo tempo pudemos testemunhar os reflexos da nossa desigualdade social. Estamos restritos aos espaços domésticos e nosso alcance real ao mundo e ao consumo diminuiu muito. E o que acontecerá quando for liberado o acesso para aqueles que estão em quarentena extravasarem tudo o que foi reprimido por meses?
Os últimos dias tem sido desafiadores. Em SP tivemos um feriadão para tentar evitar um lockdown (isolamento total) e o que muitos paulistanos fizeram? Fugiram para as montanhas ou praias. Todos estamos percebendo nossas limitações enquanto nação e enquanto indivíduos após um isolamento forçado. Temos limites financeiros, temos limites de locomoção, temos limites de atuação. Estamos inclusive desenvolvendo formas de atuar à distância – estamos fazendo reuniões, comemorações e encontros via internet.

Mas um dos aspectos que tem mexido de modo profundo com todos é a nossa relação com o dinheiro e o consumo. Há muito que estamos centrados no ciclo que inicia com o trabalho que nos dá acesso à renda que será enfim usada para suprir nossas necessidades e desejos. Alguns estão ficando sem trabalho. Alguns tiveram o trabalho suspenso e a renda diminuiu. Outros continuam como antes, só que trabalhando em casa (homeoffice).
É notório que a situação mexeu com nossos hábitos de consumo. Alguns já manifestaram que a fatura do cartão diminuiu pela metade, o consumo de combustível e a utilização de meios de transporte quase zerou, o lazer diminuiu consideravelmente. Outros descobriram os aplicativos de refeição, as promoções e saldões de todas as espécies por grupos no whatsapp ou pela internet; e as compras online. Para quem tem acesso e dinheiro disponível, o consumo pode ter aumentado. Para os que são assalariados ou profissionais liberais, o risco da diminuição de renda parece estar provocando uma atitude conservadora de restringir os gastos e economizar para o futuro – restrição de gastos, repressão de desejos e rezando para passar logo.

Sabemos que a maioria das restrições provoca um descontrole na sequência. Alguns têm chamado esse comportamento de “consumo de vingança” – o pensamento que guia esse consumo é o seguinte: já que não foi possível fazer o que se desejava por um período de tempo, ao final das restrições se fará tudo sem muito controle.
Tenho tanta saudade… e aí cada um tem saudades de um local, de um comércio, de um produto, uma experiência. Existem dados que comprovam, por exemplo, que após um período de restrição, o consumo de produtos de luxo aumenta. Produtos que em tempos normais você não compraria, você se permite comprar por ter suportado uma situação difícil – o pensamento que guia esse consumo: “eu mereço!”.

A boa notícia? Temos livre arbítrio! O consumo consciente é uma opção. Quem ainda não colocou na ponta do lápis a sua contabilidade individual, terá muitas surpresas quando o fizer. Economia, como diz o Prof. Boaventura de Souza Santos, é cuidar da casa, cuidar de nós. E isso é, mais do que livre arbítrio, responsabilidade e amor.
Então vamos combinar de pensar a respeito do que realmente queremos para o nosso futuro e de sermos conscientes quando tivermos a liberdade de voltar a fazer o que bem entendermos?