Como a escolha presidencial americana pode interferir na política ambiental do Brasil?

(Inicialmente, gostaria de informar que este texto respeita as projeções de vitória da chapa Biden/Harris para as eleições 2020 feitas pelas agências de notícias Associated Press, CNN, ABC, entre outras.)

No momento que escrevo este texto, estamos no meio de mais uma polêmica do presidente brasileiro. Na terça-feira, dia 10/11, em uma entrevista coletiva, Bolsonaro disse que “apenas na diplomacia não dá… é preciso pólvora” [1]. Ele se referia a uma fala do presidente-eleito Joe Biden em um debate em que ele propôs investimentos à Amazônia, desde que o Brasil “parasse de destruir a floresta” [2].

Joe Biden, presidente eleito dos EUA. / Fonte: Jonathan Ernst / Reuters.

Várias pessoas já escreveram sobre o que esperar para o Brasil com Biden na presidência dos EUA, mas este é um momento em que líderes começam a definir estratégias nas relações com o novo comandante-chefe da maior potência mundial do ocidente. O que isso tudo quer dizer? Como devemos nos preocupar com o futuro da Amazônia agora que sabemos que Joe Biden foi eleito presidente dos Estados Unidos?

Trump e Bolsonaro, aparentemente, tiveram uma boa relação nestes últimos dois anos. O presidente brasileiro nunca escondeu sua admiração pelo colega americano [3]. No campo ambiental, os dois têm uma aproximação ideológica: negam o aquecimento global [4]; pregam um desenvolvimentismo agro-industrial e o nacionalismo na política internacional.

Imagem: Isac Nóbrega/PR / Reprodução: Último Segundo IG.

Biden, por outro lado, não compartilha totalmente das mesmas ideias dos dois. Uma das suas pautas de campanha foi o investimento em políticas públicas para diminuição das mudanças climáticas e o retorno dos EUA ao Acordo de Paris. Essas promessas de campanha já aparecem em o que é agora seu plano de governo [5]. Biden espera investir em tecnologia verde e criar empregos nessa área diminuindo a emissão de carbono dos Estados Unidos até 2050.

Pensando na próxima década, líderes se aproximam do presidente-eleito para dialogar sobre, entre outras coisas, o clima do planeta. Boris Johnson, Primeiro Ministro do Reino Unido, convidou Biden para participar da COP26 (Conferência das Nações Unidas para o Clima) em 2021 na Escócia [6]. Lembrando da boa convivência com Trump, Johnson citou ainda que Biden pode contribuir para um “retorno ao tipo de negócio que estamos acostumados a fazer: defender a democracia em todo o mundo, os direitos humanos” [7].

Primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson. / Fonte: UK Parliament/Jessica Taylor/Handout via Reuters / Reprodução: G1.

Por trás dessa aproximação existe o entendimento de que Biden não é tão entusiasta quanto Trump da saída do Reino Unido da União Europeia, por isso, será preciso fortalecer as relações diplomáticas entre os dois países. E é assim que se é feito há algumas décadas. Quando um país depende do apoio de outro, ou depende comercialmente, ele busca uma aproximação diplomática estratégica.

A situação do Brasil, neste momento, é tensa. O país investiu muito em uma relação entre líderes, não entre Estados. Por ser um parceiro histórico do nosso país, não acredito que os EUA venham a “escantear” o Brasil. Contudo, na pauta climática, se não houver uma mudança de postura do presidente brasileiro, é possível que aquelas discussões entre França e Brasil vistas em 2019 se repitam, mas, dessa vez, entre Biden e Bolsonaro. No entanto, no caso de uma discussão desses dois últimos, nós teríamos muito mais a perder. As sanções possivelmente impostas ao Brasil por parte dos EUA podem de fato vir a constranger o Executivo brasileiro a fazer o que aquele país quer.

Por um lado, pensando positivamente, isso pode significar que o Brasil volte a investir em política de proteção para a Amazônia, mesmo que a contragosto. Só que, do ponto de vista de Estado, é muito melhor que as políticas partam de uma vontade soberana do que de imposição externa. O que irá de fato acontecer, não sabemos, mas torço para que a apreensão fique apenas como um registro desse momento tenso e não se concretize.

Referências:

[1] O GLOBO. ‘Apenas na diplomacia não dá’, diz Bolsonaro ao citar proposta de Biden sobre Amazônia. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/mundo/apenas-na-diplomacia-nao-da-diz-bolsonaro-ao-citar-proposta-de-biden-sobre-amazonia-1-24739152>.

[2] BBC News Brasil. A proposta de Biden para a Amazônia e por que ela irritou Bolsonaro. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-54364961>.

[3] Último Segundo IG. Bolsonaro diz “I love you” pra Trump, mas não recebe “te amo” de volta. Disponível em: <https://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2019-09-25/bolsonaro-diz-i-love-you-pra-trump-mas-nao-recebe-te-amo-de-volta.html>.

[4] El País. Trump sobre relatório climático do seu Governo: “Não acredito”. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/27/internacional/1543283242_634443.html>.

[5] BBC News Brasil. Joe Biden eleito nos EUA: quais são suas propostas em 8 temas cruciais. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-54858509>.

[6] Reuters. UK PM Johnson invites Biden to COP26 climate conference next year. Disponível em: <https://www.reuters.com/article/uk-britain-usa-johnson-biden-cop26-idUKKBN27Q2RN>.

[7] BBC News. Boris Johnson congratulates Joe Biden in phone call. Disponível em: <https://www.bbc.com/news/uk-politics-54892505>.

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OLIVEIRA, Tassi. Como a escolha presidencial americana pode interferir na política ambiental do Brasil?. Autossustentável. Disponível em: <https://autossustentavel.com/2020/11/como-a-escolha-presidencial-americana-pode-interferir-na-politica-ambiental-do-brasil.html>.

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