Quanto vale a nossa riqueza natural? O uso permitido das Unidades de Conservação e Terras Indígenas
As Unidades de Conservação são espaços ambientalmente protegidos e possuem categorias de acordo com as características da região e o uso que se pretende fazer do espaço. Vai desde os tradicionais Parques e Florestas, que possuem grandes restrições de uso, até as Áreas de Proteção Ambiental e Reservas Particulares do Patrimônio Natural que já partem do princípio de que existe população habitando a área e que, desta forma, algumas atividades serão desenvolvidas ali. De qualquer forma, a criação destes espaços acontece através de lei (ou decreto).
No Brasil, as Unidades de Conservação formam um sistema, englobando todas as categorias – o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. O objetivo de criarmos esses espaços de proteção é para que tenhamos um mínimo de natureza protegida, como se este mínimo fosse a nossa garantia de qualidade de vida (qualidade do ar, manutenção dos biomas, preservação de espécies e da biodiversidade).
Via de regra, em unidades de conservação há partes em que a mata nativa deve ser preservada e outras em que se permite a utilização para fins de pesquisa e turismo orientado (normalmente trilhas rústicas – para ler a matéria “O acesso às áreas protegidas e o equilíbrio natural“, clique aqui). Naquelas unidades em que existem populações residindo, as famílias residentes podem efetuar o uso da terra para subsistência.
As terras indígenas, assim chamadas aquelas habitadas pelos remanescentes povos indígenas, são igualmente demarcadas por lei e tem seu uso restrito ao povo indígena que lá habita. Os povos tradicionais possuem um profundo sentido de harmonia com a natureza e não realizam uso comercial destas áreas. Inclusive seus artesanatos são feitos de partes da planta (ramos, folhas, cascas) que não impliquem no seu sacrifício. São autorizados também os cultivos para subsistência.
Esses povos que tradicionalmente habitam o território que hoje chamamos Brasil, já estavam aqui muito antes de formarmos esta nação. Já conviviam com a riqueza natural que possuímos e com ela compartilhavam e cooperavam. Para eles, a mata não é apenas um monte de árvores e outras espécies vegetais e animais. A mata tem vida, tem espírito. Eles se comunicam. Independente de qualquer julgamento que possamos fazer com a cultura e modo de vida indígena, eles já conviviam aqui bem antes dos colonizadores chegarem. Reservar um pequeno pedaço de terras ao redor de suas aldeias, a fim de garantir que eles possam sobreviver e viver do seu modo típico, é mais do que respeitar um direito, é respeitar a vida e a existência.
Em ambos os casos, se parte do princípio de que a convivência entre os seres humanos e a natureza deve buscar a preservação e a harmonia. Juridicamente podemos afirmar que a restrição do uso das terras protegidas e indígenas é a forma que o Estado brasileiro utiliza para garantir o cumprimento de metas internacionais de proteção ambiental e criar sua reserva verde para o futuro; para o proprietário, seu direito de propriedade sofre uma limitação de uso em favor do direito que a sociedade como um todo possui de um ambiente ecologicamente saudável.
Nos últimos dias foi noticiado que o Brasil pretende:
a) autorizar a exploração das terras indígenas e;
b) conceder as Unidades de Conservação à iniciativa privada.
Para aqueles que comemoraram todos os passos que nos trouxeram até esse momento, desde a Declaração dos Direitos Homem, passando pela Constituição Federal de 1988 e culminando com uma lei complementar que criou o SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação – estamos enfrentando um retrocesso sem precedentes e desconectado de qualquer política ambiental mundial. Entramos na contramão do mundo a 400 km/h. A colisão será inevitável!
Os direitos dos indígenas serão contrapostos aos direitos das mineradoras. O direito ao meio ambiente contraposto à fome da iniciativa privada. A título de exemplo, no último ano o governo do Rio Grande do Sul fechou o Jardim Botânico de Porto Alegre, bem como desmontou a estrutura administrativa que o mantinha. Meses depois da notícia, foi anunciado para aquele local um mega empreendimento com torres comerciais, um shopping e um condomínio residencial. Era uma área considerável de terras em meio à capital do estado, sonho de consumo de qualquer construtora/ incorporadora. Qual foi o retorno deste desmonte para a população? Verifiquem as atuais notícias sobre o estado do Rio Grande do Sul.
Mas não apenas a colisão entre direitos. As cobranças daqueles países que conosco firmaram tratados e compromissos internacionais; as consequências econômicas que isso gerará; o impacto que teremos na saúde e qualidade de vida da população…
Você sabe de quanta terra estamos falando? Tem noção de qual é o valor em jogo? Quanto vale a nossa riqueza natural? Sabe o que acontecerá com as populações indígenas depois disso? Entende a repercussão internacional dessa decisão (relações e acordos criados e mantidos há mais de 50 anos que serão rompidos)? Nem eu. Mas sinto uma dor imensa porque tenho noção do tamanho da luta que foi conseguir proteger pequenas áreas, reerguer a Serra do Mar, conseguir aprovar cada uma das leis e decretos que criaram Unidades de Conservação.
Você está disposto a trocar unidades de conservação e terras indígenas por dinheirinhos? Sabe para onde vai esse dinheirinho depois? Precisamos saber antes de concordar, você não acha?
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STEFFEN, Janaína. Quanto vale a nossa riqueza natural? O uso permitido das Unidades de Conservação e Terras Indígenas. Autossustentável. Disponível em: <https://autossustentavel.com/2019/05/o-uso-permitido-das-unidades-de-conservacao-e-terras-indigenas.html>.