A Revolução da Alimentação
Em um mundo fragmentado e dominado pelo medo, algumas iniciativas brotam para disseminar a cultura da boa produção e alimentação. De forma saudável e diversa, no coração das transformações política, social e econômica a Schumacher College nos ensina como a escolha dos alimentos é importante para o futuro do nosso planeta.
Apesar das diferenças e diversidades, estamos todos conectados. Conectados através da terra e do alimento, a verdadeira rede da vida. Conectados através da nossa humanidade comum.
O diferencial e revolucionário ato de optar por comunidades de produtores locais menos suscetíveis a processos industriais – diferenciados pela sua autenticidade e qualidade dos seus produtos – busca colocar pequenos produtores como plano central no sistema alimentar. A globalização subestima a economia local, o conhecimento indígena e a diversidade de espécies e culturas.
Durante as últimas décadas, a produção, o processo e distribuição de alimentos tem excluído inúmeras mulheres, pequenos produtores, assim como a agricultura familiar, passando a ser monopolizados por grandes corporações globais como Monsanto, Cargill, Phillip Morris e Nestlé. Pequenos produtores ao redor do mundo estão sendo excluídos e destruídos pela injusta competição dos gigantes do agronegócio. O movimento antiglobalização tem focado na injusta competição do mercado global que está levando os pequenos produtores à falência, dívidas e até mesmo suicídio.
No entanto, a despeito dessa guerra injusta, os pequenos produtores e as comunidades locais não só se recusam a desaparecer como estão moldando um futuro além da globalização. A resiliência dos produtores que continuam a salvar e compartilhar suas diversas sementes, vivendo suas diversas culturas e celebrando seus diferentes modos de alimentação mantêm a força e energia necessária para a continuação desta batalha. É preciso manter acesa a chama que promove o pequeno mercado descentralizado e a produção biodiversa.
Este não é o mundo da Organização Mundial do Comércio (World Trade Organization – WTO) onde somente o agronegócio existe, onde agricultura significa basicamente soja, milho, arroz e trigo, onde uma única empresa (Monsanto) controla 94% dos organismos geneticamente modificadas (GMOs – geneticaly modified organism) e onde a maioria da produção não serve de alimento para os seres humanos, mas para bilhões de animais de cativeiro em fazendas industriais. Este é um mundo onde pequenos produtores agrícolas geram mais do que fazendas industriais usando menos recursos.
A biodiversidade protege a saúde da terra e a saúde das pessoas. A qualidade, o gosto e a nutrição deveriam ser os elementos essenciais e requisitos para a produção e para o processo alimentar, sem elementos tóxicos e sem gerar um lucro exorbitante para o agronegócio. A diversidade nos oferece a oportunidade de transformar nosso sistema de alimentação. A diversidade do cultivo, de alimentos e de culturas produz a resistência à monocultura e estimula alternativas criativas. Nossa força vem de nossa variedade e singularidade, uma força que pode ser erradicada somente quando desistimos de nós mesmos.
Campanha “Comida é Patrimônio” do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN)
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É importante oferecer oportunidades e canais para articularmos um novo paradigma para alimentação. É importante defender nossos direitos a uma alimentação sadia e estimular o conhecimento e criatividade dos pequenos produtores. Precisamos abandonar a lacuna entre produtor e consumidor. De acordo com o fundador do movimento Slow Food, Carlos Petrini: “precisamos ser coprodutores”. Consumir significa destruir. No ato de nos alimentarmos já estamos participando da produção. Ao nos alimentarmos de orgânicos estamos falando “não” aos agrotóxicos e estamos apoiando os produtores de orgânicos. Ao rejeitar sementes geneticamente modificadas estamos votando pelo direito à agricultura familiar, pelos pequenos produtores, e também pelos direitos da população à informação e à saúde. Ao nos alimentarmos da produção advinda das comunidades de produtores locais, estamos enfraquecendo e diminuindo os lucros das empresas do agronegócio e fortalecendo nossa comunidade local de produtores. Os que comem são então os coprodutores, pela sua relação com os pequenos agricultores que criam um caminho possível para a sustentabilidade, justiça e um sistema alimentar saudável.
Cartaz retirado da revista Nova Escola. (Clique na imagem para ampliar) |
Ao fazer escolhas sobre o que comemos, fazemos escolhas sobre quem somos. A industrialização e globalização do nosso sistema de alimentação está nos dividindo: Norte-Sul, produtores e consumidores, ricos e pobres. A parte mais significativa da fonte desta separação é o mito da alimentação “barata”, o mito de que sistemas de alimentação industrializados produzem mais alimentos e consequentemente são necessários para acabar com a pobreza. No entanto, pequenos, biodiversos cultivos orgânicos têm maior potência do que a produção de monocultura em larga escala. Os alimentos produzidos de maneira industrial não são baratos. O custo é muito alto para o planeta, para os produtores e para a nossa saúde. O planeta não pode mais carregar as consequências da exploração de <
/span>águas subterrâneas, poluição devido aos agrotóxicos, a perda de espécies e a desestabilização do clima. Produtores não podem mais carregar o peso das dívidas inevitáveis causadas em decorrência da valorização excessiva da agricultura industrial. Cento e cinquenta mil produtores cometeram suicídios na Índia como um sintoma da profunda crise devido ao dominante modelo de produção e exploração do agronegócio.
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) revelou que o mundo produz alimento para 12 bilhões de pessoas, enquanto existem “apenas” 6.3 bilhões de pessoas vivendo no planeta. Destes, 800 milhões estão com fome e 1.7 bilhão sofrem de obesidade. A batalha que estamos lutando faz parte de uma guerra pela civilização e é contra um sistema que é incapaz de produzir alimento de maneira segura, culturalmente apropriada, saborosa e com qualidade. E é incapaz de produzir alimento suficiente para todos porque atua sem se preocupar com o desperdício de terras, água e energia. A agricultura industrial consome dez vezes mais energia do que produz e dez vezes mais água do que agricultura ecológica. E é, portanto, dez vezes menos eficiente. A eficiência do trabalho é também um mito. Todos os pesquisadores, bioengenheiros, produtores de agrotóxicos, motoristas de caminhões e soldados engajados em guerras pelo óleo fazem parte do processo industrial do sistema do agronegócio. Quando a agricultura se torna uma guerra e armas de destruição em massa são substituídas por agrotóxicos e GMOs, o alimento se torna o não alimento. O mercado baseado em preços irreais e injustos não é mais mercado, se torna exploração. A agricultura industrial é barata não porque é eficiente – seja em termos de recursos ou de eficiência de energia – mas sim porque é apoiada por subsídios e representa todos os custos – as guerras, as doenças, a destruição ambiental, a decadência cultural e a desintegração social.
Fonte: Porto Alegre RESISTE! |
A Schumacher College é um espaço no qual é possível celebrar a agricultura honesta e onde os preços não mentem. Não há exploração do planeta nem dos guardiões da terra. Schumacher é uma celebração de uma economia viva na qual coproduzimos com as formigas, lagartas e com os fungos. Estamos todos conectados na teia da vida e é o alimento que gira esta teia.
Estou testemunhando uma nova democracia da agricultura através da liberdade dos produtores e fazendeiros. Fazendas orgânicas, livres de agrotóxicos, toxinas e corporações – sementes geneticamente modificadas e patenteadas – estão criando uma nova democracia para contestar o atual sistema ditatorial da agricultura. E você? Está comendo o que?